sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

Fuga/cidade ou Fugaz Idade

Antonio Pereda y Salgado



Entre mim e o texto não há lugar para resíduos tóxicos do coração.Quer-se a absoluta explosão do sujeito conforme as pautas rasuradas de Satie, num confronto de guerra fria celebrada entre a potência feminina e a fragilidade das palavras abandonadas no cais.
O eu cede definitivamente lugar à mais delirante fantasia de cabaret, mascarada de tragédia lusitana que é a de não haver lugar a tragédia nenhuma. As personagens são, por isso e apenas, fotocópias acintosamente retocadas com maquilhagem estrondosa, mas bonecos manipulados e manipuláveis em todas as direcções. Tão depressa vomitam como cantam, se abraçam como se esfaqueiam. E não procuram perceber nenhum motivo, porque a representação é a própria vida.
Fica declarada em letra impressa desde o Génesis da civilização industrial a morte do “eu” para sossego dos múltiplos “tus” que vagueiam pela cidade à espera de serem apanhados na cilada do amor: invenção romântica que a humanidade ainda não conseguiu dinamitar [Drama burguês que Diderot impingiu às donas de casa, com a ajuda de Corin Tellado].
A Id, portanto, o espírito carnavalesco cansa-lhe as sobrancelhas e acentua-lhe as rugas do mau feitio. Por isso se encerra num mutismo inabalável, digno de uma Maina Mendes ou até de uma Irene Lisboa, vestindo a aparência mais exuberante possível de forma a afastar em definitivo todos os benfeitores militantes. Talvez fiquem então criadas melhores condições para o contrabando de almas e o tráfico de corpos em segunda mão.
O texto pode começar, meine Damen und Herrrn!

3 comentários:

isabel mendes ferreira disse...

Maravilhada!!!!!!

isabel mendes ferreira disse...

raios! que bem escrito!

© Maria Manuel disse...

que texto extraordinário! sem «fragilidade das palavras». do confronto, estas ganham vigor!

FEMINISTIZA_TE

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